DISPA-ME A ALMA…

Queres, realmente, ter-me, rendida como uma criança, totalmente absorta por você? Convida-me para uma boa conversa. Mas, aviso-te já, de ante mão, para possuir-me assim, com tamanha intensidade, imponho, no sentido mais amplo da palavra, que venhas sem medos, sem jogos, sem defesas… Desarme-te, retire a couraça do preconceito, a armadura do achismo e o escudo do julgamento. Venhas nu e lhe garantirei um prazer tão raro, especialmente, nos dias atuais, tão visceral, que a lua irá brilhar, meu caro, mesmo se a noite estiver chuvosa. Porém, segues somente alguns simples conselhos meus, conselhos de quem quer lhe proporcionar aquilo que gostaria de sentir.

Então, permito-lhe utilizar algumas ferramentas fundamentais para a execução do nosso plano. Uma delas é o olhar. Entretanto, não é qualquer olhar, pois precisa transbordar, ultrapassar a barreira física e atingir-me, como uma flecha que encontra o seu alvo, exatamente no ponto em que se fundem os meus sonhos e as minhas realidades, as minhas mazelas e as minhas belezas, o meu corpo e a minha alma. Se aceitares tal proposta, retribuirei-lhe com a mesma ousadia, com a mesma vontade e com a mesma verdade. Tornaremo-nos cúmplices, ávidos de desejo pelo prenúncio trazido por esse olhar. Desejo de ouvir, de sentir as palavras, que saem da boca como desenhos, tomando formas, ganhando cores de diferentes tons…

Aliás, esta é a segunda ferramenta, o poder inebriante e insubstituível das palavras… Conte-me os teus devaneios, as tuas sandices, os teus sonhos, deixe-me penetrar o teu mundo, com delicadeza e vigor… Ouça-me, dance ao som da minha voz, inebrie-te com a vivacidade das minhas gargalhadas e compadece-te das minhas misérias… Sejas tu, sem máscaras e eu prometo-lhe que estarei disposta a entregar-me, com calma e, ao mesmo tempo, com prontidão… Então, eu peço-lhe, dispa-me a alma, com o toque das suas palavras…